É brega, né não ?

O brega está em alta e este é um fato inegável. As cocotinhas de Boa Viagem a Casa Forte se transfiguram e não se envergonham mais em dançar o som da periferia. Tanto faz se em Itamaracá, a ex-praia da elite do Estado, ou em Tamandaré e Carneiros, neste verão todo mundo se acabou de dançar no “Vou não, quero não, posso não minha mulher não deixa, não!”.  Durante o Carnaval de Olinda, o hit ganhou nova roupagem e subiu as ladeiras com cara de frevo. Já nas prévias, os culturais do Recife incorporam as roupas curtas para bailar todas as vertentes do brega no I Love CafuçúAs barreiras do preconceito vão gradativamente sendo derrubadas e surge um brega multifacetado.


Nas noites do Recife o brega tem várias caras. Na Zona Sul, espaços como o Dona Carolina já foram palcos do estilo para a galera bonita da alta sociedade. Pelas bandas da Zona Norte o brega é uma coisa mais consistente, os de barba grande e as de sandália rasteira vão além do gingado e swing da música, o negócio é estudar as raízes e ouvir os clássicos: Odair José, Reginaldo Rossi, Sidney MagalNa periferia “o brega é original, é daqui, é da nossa gente e tem a nossa cara. Sabe, é a música que fala do mesmo jeito que a gente.” Diz a cozinheira Valdenice Costa (46) que não perde um final de semana no Bar 100% Brasil, no bairro da Boa Vista. Ah! Mas também tem os mais descolados que vão pro Brega Naite bater cabelo a noite toda no Vapor 48.

A coisa não parou na pista de dança, a classe média alta do Recife agora compõe e grava o tal do brega. Bandas como Tanga de Sereia, que mostra seu brega cult influenciado por Nelson Rodrigues e Almodóvar, fazem sucesso na cena alternativa da cidade. A banda já tem 3 cds gravados e hits estouradíssimos e cantados em coro nos seus shows, como “O homem do gás”, “Me chama de sereia” e “Primo com prima”.   Já os rapazes da Faringes da Paixão, que estão para lançar seu primeiro cd, fazem novas versões dos clássicos do brega, além de também cultuar seus amigos contemporâneos como O Conde do Brega.E quem comenta sobre essa adequação da linguagem da periferia por outras classes é o garoto pernambucano e músico, Silvério Pessoa no documentário “Do Kitsch ao cult”, “Antes uma música que representava uma classe socialmente desfavorecida, hoje é apropriada por uma classe de elite.”

E essa festa toda começou paralelamente na trindade do mundo virtual, programas de auditório (como o do lendário Denny Oliveira) e nos ‘insuportáveis’ carrinhos de som e seus cds “alternativos” (o velho e bom piratão). A internet, os canais regionais e a informalidade foram os grandes divulgadores do brega, um mercado independente que agora incomoda as grandes gravadoras e revela a cada segundo um novo grande sucesso para as próximas horas. A efemeridade dessas músicas tem a velocidade da postagem de um novo vídeo no Youtube, a galinha dos ovos de ouro do momento.

Mas o brega quer mais! Não bastam só as ruas e os estúdios de gravações, agora ele invade ,com a mesma força, os auditórios acadêmicos para se tornar coisa séria. Brotam estudos sobre suas influências musicais, sua história, seu efeito na sociedade e também para descobrir se essa garotada das classes mais altas, que vem puxando o brega morro abaixo, não quer apenas relegá-lo às formas do cômico vulgar de baixa categoria”, como observou, a respeito do grotesco, certo rapaz chamado Mikhail Bakhtin. Levado a sério ou não, foi uma música brega a escolhida pelo Ministério da Saúde para a campanha do uso de camisinha durante o carnaval.

Brega cult, brega clássico ou o bregão do povo, dançado pela playboyzada, intelectuais ou pelos bregueiros de berço no fim das contas, não tem erro, é exatamente como profetizou a Rainha do Brega Joelma, “Essa dança vai mexer com você e com o seu coração”.  Sendo você quem quer que seja, Prepare-se e “venha mover el esqueleto, mostrar que sabe bailar” ao som de muito brega!


Brega para todos os gostos

Se há duas décadas o termo brega era pejorativo, hoje, o que era cafona transformou-se num fenômeno sócio cultural, tendo em vista a mudança de seu contexto social. O gênero que ainda é reprovado pelos padrões estéticos da mídia, vem ganhando o gosto do povo. Ele deixa de ser porta voz apenas de uma categoria socioeconômica desfavorecida e passa a ser degustado também pela burguesia. Nasce assim, o brega como música amplamente difundida, ou seja, o brega sem frescura e preconceito!


Se o radinho de pilha foi o responsável por grudar o brega na cabeça do povão, o trunfo da internet foi levar o o ritmo da cozinha para sala de estar. As parafernálias digitais permitiram que o brega incorporasse novas sonoridades. O gênero que surgiu como um ritmo romântico, hoje chega com o batidão eletrônico, dando luz ao Tecnobrega. Com origem paraense, essa nova vertente é a fusão da música eletrônica e as influências locais, como o carimbó e a guitarrada. A junção disto tudo mais o gingado da lambada e da melodia caliente do merengue, constrói a principal vertente do “novo brega”, o calypso, que teve divulgação feita pelos vendedores de cd “alternativo”. Já o eletromelody se trata de uma versão mais rápida e pesada do tecnobrega. É a fusão da música de festa paraense com a dance music européia.


As facilidades tecnológicas não só levaram o brega à mais pessoas, como também levaram luz ao florescimento na produção do estilo, que é feito a preço de banana. Basta um computador e assim se faz um brega! Segundo Kléber Fonseca da Silva, produtor e cantor da Banda Lapada, o movimento brega transformou-se numa coisa caseira, não se usa mais grandes estúdios. Kléber diz que o músico de brega não ganha dinheiro com venda de cd, e sim com a música. Para isso, ele precisa fazer shows para divulgar seu trabalho. Nesse contexto, a internet surge novamente como um canal de difusão do gênero musical, contribuindo para grandes hits como o recente “Minha mulher não deixa não” de Reginho e Banda Surpresa e “Faz o V e vem pra cá” da Banda Djavú. Outro exemplo vivo (ou não, já que o dito cujo nunca mostrou as caras) é o DJ Cremoso, que transforma qualquer coisa em tecnobrega.


Entretanto, o brega enquanto música de massa e com todas as facilidades de produção e consumo nos dias de hoje, levanta a questão da vulgarização do ritmo. Segundo o professor de música da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Felipe Trotto, essa banalização não é possível, pois nem todo mundo que produz música consegue fazê-la circular e torná-la um sucesso. Para Felipe, a tendência é uma proporcionalidade entre a quantidade de pessoas que fazem música e uma melhor taxa de eficácia no que está sendo proposto, uma vez que haverá mais cabeças pensantes no processo de criação.
Para Kléber, a banalização não acontece pelo fato de que só quem tem conhecimento da música brega e das técnicas de produção é capaz de fazê-la.


Olhando bem para a cena construída pelo brega, o que se vê são todas as classes, cada qual com seu modo de absorver esse irreverente e pomposo estilo musical, se juntando cada vez mais por um mesmo propósito: se divertir! Mas esta coisa toda não é só diversão. A gente entra na festa e não para de dançar. Mas quem balança mesmo é o mercado das grandes gravadoras que não sabem aproveitar um bom som livre. É assim que o brega incomoda muita gente, sem se importar e até alimentando a pirataria com dosagens pesadas de vários grandes sucessos.


Gabriela Almeida e Marina Suassuna

De mercado em mercado o pirata das redes fez do brega o grande shopping

Chique é ser inteligente. E o brega, chiqueza pura que é, sabe muito bem disto. Foi assim que ele deixou de ser apenas mais um ritmo explosivo e transformou-se num movimento cultural ativo, forte e cafuçú, ou não. Belém do Pará e Recife que o digam! Ao mesmo tempo em que se afirma como identidade nacional pelas classes populares, o brega desenvolveu uma indústria cultural local diretamente vinculada à expansão de um mercado consumidor ligado a essa modalidade de música.   

O brega criou um mercado próprio que faz intercâmbio entre cambistas e grupos que apóiam as bandas, como uma espécie de fã-clube-produtor. E não é nenhuma novidade que a pirataria é o braço forte desse movimento, o que em primeiro momento pode parecer absurdo: Como eles ganham dinheiro? Primeiro porque esses cds não são gratuitos. Se eles custam dois reais, logo, são pagos. E segundo, que essa foi a melhor forma encontrada, assim como outros estilos musicais de massa, de se esparramar mundo afora, atraindo o que faz gerar dinheiro no bolso dos bregueiros profissionais: os shows.



As festas de aparelhagem, famosas no Pará e invenção do mercadinho do brega, simbolizam a grandeza e a força do ritmo. Mas esse modelo de potência não para nas festas de aparelhagem. Recheada com alta tecnologia e sem deixar a desejar para qualquer diva americana (tirando Beyoncé, porque aí já é pedir demais), Gaby Amarantos vem com seu tecnobrega exibir telas gigantescas de LED, iluminação de última geração, caixas de som semelhantes aos prédios caixão do bairro de Olinda, e detalhe, ela já foi até pro Faustão! (Muito glamour para uma bregueira só!).   

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E para não morrer na fofoca de mercados públicos, esse novíssimo movimento brega fez da internet o seu mercado branco sem fronteiras para deixar a fofoca rolar ladeira abaixo sem freio. Nas redes sociais (no quase extinto Orkut e no galã Facebook), nos sites de compartilhamento e em todas as entranhas do online, o brega foi chamando a atenção de um novo público. Sim! Você, burguesinho universitário que nos lê. Foi esse giro inacabado no globo virtual que permitiu que várias bandas se lançassem de forma independente cantando o estilo brega.

É de sucesso em sucesso, ou seja, de segundo em segundo, que o brega ganha força. A única certeza que podemos ter é que quando a barrinha do YouTube chegar no fim do mais novo hit do brega, esse vídeo já não será mais a última sensação. 


Ouvindo Brega

Nos podcasts abaixo tentamos fazer um mapeamento dessa música curiosa que é o Brega. No "A cultura do brega e o brega da cultura" e o "Quem leva o brega a sério"  vamos discutir, junto ao gerente de música da Fundação da Cultura da Cidade do Recife, Evandro Sena; ao produtor musical, Kléber Fonseca da Silva; ao músico Tonfil; ao cantor Conde do Brega; aos integrantes da banda Tanga de Sereia, Dani Gouveia e Paulo Trajano; e ao professor de trilha sonora da UFPE,  Felipe Trotta, dentro de um contexto histórico e social, como uma música  intimamente ligada à periferia está sendo apropriada pela classe média. Já no segundo podcast "Entre piratas e navegadores", a partir da ideia de que a inclusão digital está influenciando a divulgação desse gênero musical, aproveitamos para  abrir debate sobre a eficácia das polêmicas ferramentas que essa música possui para se divulgar: o chamado comércio pirata e, hoje em dia, a revolução dos downloads gratuitos de músicas e de vídeos pela internet.

Agradecimentos à todos os que colaboraram com esses arquivos e à Lucas Neves, Maria da Conceição Maciel e Marcela Lins, as vozes que começam o podcast "A cultura do brega e o brega da cultura".

E vida longa ao Brega !            

Quem leva o brega a sério ? by bregaforall

 o brega entre piratas e navegadores by bregaforall
Trilha Sonora :
- A cultura do brega e o brega da cultura                                                         
Labaredas - Procure me esquecer
Carlos Alberto - Aquece-me esta noite 
Reginaldo Rossi - Festa dos pães
Odair José - Foi tudo culpa do amor
Calypso - Louca paixão
Jane Birkin - Quoi
Reginho e Banda Surpresa - Minha mulher não deixa não
Tanga de Sereia - Solteira, livre e desimpedida 
Tanga de Sereia - Me chama de sereia
Techno brega show - Cyber Carimbó de Belém
The dictators - Fast and louder
Dj Cremoso - Lisztomania (remix)
Dj Cremoso - Take me out (remix)


- Quem leva o brega a sério
Chama do brega - PM do amor 
Banda top 10 - Minha irmã bote fé
Tanga de Sereia - Cada qualidade de homem
Conde do Brega - Ninguém é perfeito e a vida é assim


-Entre piratas e navegadores
Conde do brega - Inconsolado 
Calypso - Xonou xonou
Banda kitara e Musa do Calypso - Se liga amiga 
Banda Lapada - Faz o L

Fiquem agora com "Ninguém é perfeito e a vida é assim"

Parem os carros de som que o Brega For All está chegando...
“Niguém é perfeito e o Brega é assim” é mais uma produção Brega For All para mostrar a diversidade e pluralidade do nosso brega histórico e contemporâneo. Artistas, produtores, pesquisadores e consumidores locais do brega, juntos no mesmo balaio para difundir essa arte singular que toca no coração dos apaixonados.
Qual o conceito de brega? Sua música é brega? Você é brega? E o brega, é cult? Até onde a internet pode ajudar na divulgação do brega?
Dividido em duas partes, nossa super produção separou para você o fim das suas dúvidas e pré-conceitos sobre o brega. Então vamos curtir, porque ninguém é perfeito e o Brega é assim...

Texto de apresentação: Maria Júlia Vieira