Por Clarissa Macau
Numa sociedade cheia de contradições e transformações sociais como a nossa, o Brega com suas vertentes eletrônicas aparece fazendo barulho. As letras e o ritmo que abusam da sensualidade e do humor, se encontram em meio a velha e até cansada indagação: gosto se discute ?! Como reflexo de uma parcela da sociedade brasileira, formada pela classe trabalhadora e pela juventude "cybermana", essa música parece indignar aos conservadores (e talvez elitistas); interessar aos estudiosos que se debruçam sobre as complexidades por trás desse estilo, enquanto jovens se divertem, independentemente de suas classes e intenções.
Hoje em dia as bandas e cantores de brega, surgindo aos montes, na maioria das periferias das cidades do Norte e do Nordeste, têm mais chances de expressar sua regionalidade para além das rádios, da mídia local e da sua classe "nativa". Em grande parte, graças às novas tecnologias: internet e programas de computador, específicos para música, auxílios que faltavam para divulgação e produção espontânea desses músicos, que criam seu próprio show business e parecem ignorar as condições supostamente degradantes em que vivem, cantando sobre amor, traição e sexo ao seu próprio modo. Fugindo de padrões e fazendo parte de uma nova construção da realidade do país.
Numa sociedade cheia de contradições e transformações sociais como a nossa, o Brega com suas vertentes eletrônicas aparece fazendo barulho. As letras e o ritmo que abusam da sensualidade e do humor, se encontram em meio a velha e até cansada indagação: gosto se discute ?! Como reflexo de uma parcela da sociedade brasileira, formada pela classe trabalhadora e pela juventude "cybermana", essa música parece indignar aos conservadores (e talvez elitistas); interessar aos estudiosos que se debruçam sobre as complexidades por trás desse estilo, enquanto jovens se divertem, independentemente de suas classes e intenções.
Hoje em dia as bandas e cantores de brega, surgindo aos montes, na maioria das periferias das cidades do Norte e do Nordeste, têm mais chances de expressar sua regionalidade para além das rádios, da mídia local e da sua classe "nativa". Em grande parte, graças às novas tecnologias: internet e programas de computador, específicos para música, auxílios que faltavam para divulgação e produção espontânea desses músicos, que criam seu próprio show business e parecem ignorar as condições supostamente degradantes em que vivem, cantando sobre amor, traição e sexo ao seu próprio modo. Fugindo de padrões e fazendo parte de uma nova construção da realidade do país.
Música de excluídos da sociedade ?!
O cineasta e jornalista paraense Vladimir Cunha - que dirigiu junto a Gustavo Godinho o filme Brega S/A - declara "o brega é a música feita pelo cara que, até pouco tempo atrás, era o fã que estava lá no meio da galera curtindo a festa". O estilo genuíno das comunidades de periferia, mostra que a música não é exclusividade de profissionais com anos de treinamento. O recifense Klébson Gonçalo de Oliveira Corrêa, 18 anos, mais conhecido como DJ Kebinho, e dono do mote "Abalando o Recife" é um exemplo disso. O Dj morador do Ibura, que divulga seu trabalho pela internet no Orkut, 4shared, MSN e blog pessoal , tem a agenda lotada durante toda a semana, chegando a receber convites para apresentações em São Paulo e no Rio de Janeiro, e diz que "só precisei ganhar um computador", para logo em seguida começar a carreira agitando bailes de brega. Além disso, Kebinho tem critérios para abalar a capital pernambucana e agradar aos seus clientes, "é brega romântico para corôa, e tecnobrega para boyzinho".
Segundo o professor Fernando Fontanella da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e mestre em comunicação pela UFPE, "o brega é a tentativa de criar um show business" ao mesmo tempo que pode ser considerado subversivo. Seus produtores, além de construírem um mercado fonográfico particular, baseado na informalidade (o que não implica na não seriedade, desse, como negócio) que trai a lógica de consumo ainda hegemônica, "ignoram o fato de que são excluídos e fingem que fazem parte do sistema que inicialmente não os quer", a partir dos figurinos que vestem e da postura de aparente autoestima elevada dos seus integrantes. Dessa maneira o brega se distingue de movimentos musicais mais politizados como o Hip Hop que denuncia uma sociedade injusta . O brega nem quer saber disso. Longe de ser uma resistência alternativa, buscam influências em Hollywood, artistas globais e música pop americana misturadas aos ritmos populares como o carimbó, o calypso e o funk carioca para inspirar o novo brega eletrônico. Esse, quer sucesso, tocar corações e também, segundo a vocalista Cheila Silva da banda Swing do Pará: "fazer dançar".
A Swing do Pará surgiu há oito anos juntando integrantes do Recife e de Belém do Pará. A banda que faz o som tecnomelody chegou a se apresentar no programa global TV Xuxa . Cheila afirma que a sensação de estar em rede nacional foi "uma emoção única. Só esperava ter mais retorno através disso", referindo-se a uma promessa da produção do programa sobre um "repeteco" da apresentação que até hoje não foi concretizada.
A mídia tradicional, começou a ver nos representantes do brega a possibilidade de dialogar com as classes mais pobres. Quem deixou as portas abertas para bandas como Swing do Pará aparecerem em rede nacional, foi a banda Calypso de Joelma e Chimbinha, hoje com mais de dez anos de carreira. Na primeira aparição da banda no Faustão alguns ficaram atordoados com a possibilidade de uma música de "mau gosto" ser espalhada, enquanto outros se perguntaram se o grupo continuaria o mesmo. O professor Fernando Fontanella acredita que há uma profissionalização e certa domesticação natural para que esses grupos sejam difundidos através da TV produzida pela elite. Mas "quando Calypso aparece no Faustão significa que a banda mudou muito mas também significa que o Faustão mudou muito. Os dois lados cedem".
O prazer sem compromisso do Brega
Para muitos, o Brega, principalmente sua nova safra, só pensa em uma coisa: sexo. O aspecto da chamada "azaração", nessa música, é muito criticado por seus 'antipatizantes' que estigmatizam-no de vulgar. Letras e interpretações livres de pudores como nas canções "Posição da rã" e "Nóis gosta de novinha" - ambas de Mc Sheldom e Mc Boco - costumam causar risos nervosos e deixar muito pai e mãe de família classe média boquiabertos. Por que esse tema é uma constante nas letras dessas músicas ?! Dj Kebinho acredita que seja "para influenciar as novinha" - referindo-se às meninas menores de idade - mas ao mesmo tempo faz um parêntese reclamando da visão generalista das pessoas sobre as ouvintes do brega e abre o jogo "É mentira, por exemplo, pensar que uma mulher vai trair o marido por causa de uma música. Tem nada a ver. Uma mulher já cabeça não faz essas coisas, mas é diferente da menina de 14, 15 anos que nem pensa direito. Na moral."
Para o jornalista Vladimir Cunha, a realidade caótica, que inclui em seu cotidiano a convivência direta com a violência sexual contra crianças, adolescentes e mulheres "contribuem para a forma como a sexualidade se reflete na percepção dessa gente", que não por exceção, tem a ideia do sexo presente desde a infância, e completa: "a sexualidade nos bairros mais pobres é vivenciada e entendida de uma maneira diferente da forma como a classe média lida com o assunto".
Para o jornalista Vladimir Cunha, a realidade caótica, que inclui em seu cotidiano a convivência direta com a violência sexual contra crianças, adolescentes e mulheres "contribuem para a forma como a sexualidade se reflete na percepção dessa gente", que não por exceção, tem a ideia do sexo presente desde a infância, e completa: "a sexualidade nos bairros mais pobres é vivenciada e entendida de uma maneira diferente da forma como a classe média lida com o assunto".
Na periferia, quase sempre, as regras não são as oficiais. Além da violência sexual, outros gêneros de violência e a convivência com o tráfico de drogas, estão presentes na vida das comunidades pobres. "As classes mais altas introjetam involuntariamente as leis, mas já na periferia, grande parte das pessoas sabem quando algo é considerado errado mas não introjetam as regras impostas por uma esfera social que não é a sua. Quando faz isso é com descontinuidade, porque eles não se identificam com essas leis ficando muito mais fácil de se tolerar a evasão da regra!" exclama o professor Fontanella que acredita que os regulamentos rígidos não têm vez na sensibilidade brega, onde a ação, a performance superam o significado. "O brega trabalha o sexo como performance. O prazer não vem como símbolo, vem como ato". Qualquer visão mais poética possivelmente está fora de questão. O que vai de encontro ao que a cantora e percussionista Ganga Barreto, vocalista da banda Observatório, pensa: "todo o estilo musical pode falar normalmente de sexo. Mas, não tão explícito como as palavras baixas usadas nas letras de brega". Por outro lado, Vladimir Cunha acredita que o mundo do brega não é tão flexível e possui "suas próprias regras, e quem o produz acaba seguindo-as para poder emplacar e sobreviver".
A vocalista da banda Swing do Pará, Cheila Silva vê como normal a opinião de pessoas que percebem o brega como apelativo "porque realmente temos o lado ruim, que faz isso mesmo, assim como o forró fala muito de 'bebedeira'. É uma faca de dois gumes" mas para ela sua banda não se enquadra nesse "lado ruim".
Acompanhado do Funk carioca e do Forró estilizado, o brega vai seguindo sua trajetória espalhafatosa e sem subterfúgios, para além da periferia, tocando em temas de maneira considerada "selvagem" pelas pessoas ditas civilizadas.
Veredito: Culpado ou inocente ?
Hoje, o brega tem seu próprio show business e já se relaciona com a considerada hegemonia cultural sem deixar por isso de tocar em assuntos de forma pouco usual na música dita "de qualidade". O brega está extrapolando o limite da exclusão social e chega aos ouvidos e corpos dos jovens de classe média. O paraense José Roberto Ferreira da Costa, webmaster do site Brega Pop - que tem em média 1400 visitantes por dia - observa que "o tecnobrega conseguiu a proeza de estar praticamente na maioria das camadas sociais, visto que até em festas das chamadas "elites" o ritmo também está inserido. O agora tecnomelody ganhou definitivamente a classe média". Em Belém do Pará os jovens mais ricos chegam a receber descontos e até entram de graça nas festas de aparelhagem. O consumo e a apropriação desse ritmo apesar de, por vezes, serem irônicos acabam produzindo um diálogo cultural entre classes até pouco tempo muito distantes, gerando reconhecimento. Para o professor Fernando Fontanella "existem pessoas de classe média que acaba gostando genuinamente a partir desse consumo irônico".
Apesar dessa conquista de terrenos alheios, o brega continua alvo de críticas ferrenhas por parte de seus detratores: os especialistas e amantes, em geral, da "boa música" que veem como vítimas ou cúmplices passivos os ouvintes do brega, tanto pela falta da qualidade musical técnica bregueira, quanto pelo seu conteúdo literário duvidoso que supostamente motivaria o status quo da probreza de muitos no país. Isso seria subestimar esses ouvintes ?! Para Fontanella, sim! Ele volta a opinar: "longe de serem passivas, essas pessoas têm uma agência muito forte. Mais agentes até do que fãs de outros estilos musicais que as vezes se mostram como verdadeiros zumbis". Essas pessoas quase sempre têm acesso aos seus ídolos, e podem, por que não, montar a sua própria banda e os seus próprios bregas como eles.
O cineasta e jornalista Vladimir vê o brega como música pop, e não interpreta como crime dizer que essa música é pobre, na sua opinião, assim como rock n'roll, e dispara "As pessoas têm a tendência de achar que o rock é uma expressão superior, mas se esquecem que ele também é muito pobre em termos estéticos. É uma música de três acordes que tem versos como 'she loves you yeah yeah yeah' que são tão pueris e pobres quanto uma letra de tecnobrega" e tem para si que música pop, como o brega, tem a função de divertir e não de educar. Mas nada fica livre de um ônus. Para o jornalista, o problema estaria no caso específico do tecnobrega, se a pessoa que escuta essa música se restringe somente a ela "aí, sim, ouvir essa música alienada e fugaz se torna um problema". Quantas pessoas possuiriam esse problema ?!
Para parte dos brasileiros a função do brega é emburrecer a sociedade, para os bregueiros - tanto fãs quanto ídolos - a função é divertir, e para estudiosos como Fernando Fontanella tem a função de revelar. Existem ainda mais coisas a se revelar além da "rã" e da "periquita" ?! O professor explica: "o brega revela coisas que estavam ocultas para a elite cultural", além disso ele funciona como uma manutenção muito forte na autoestima dos participantes dessa cultura. Com a cena brega, a possibilidade de alçar patamares além da pobreza se tornou realidade, "ele faz parte de uma construção de uma nova hegemonia, de um novo acordo social a partir da introdução de gente nova na sociedade de consumo".
Entre otimismos e pessimismos, o brega se estabelece na sociedade e instabiliza o mercado fonográfico tradicional. Os novos bregas assim como os antigos são uma produção genuína da periferia e vêm se apropriando de diversas linguagens do seu universo e de fora dele. Agora pergunto: O brega é um alerta para a sociedade de que alguma coisa não vai bem ? O que eles cantam é errado? Mas se o país proporcionasse condições igualitárias para todos, o brega e sua expressão hedonista teriam vez ? Podem criticar ou analisar o quanto quiserem mas, certamente, nos próximos dias, meses e anos muitas pessoas se divertirão, e sim, desfrutando de letras de genialidade peculiar que contam o dia dia e as atitudes, talvez incoerentes para alguns, mas espontâneas de um povo criativo que constrói seus próprios conceitos.
Para terminar, o podcast abaixo trás algumas opiniões do Povo sobre a música Brega atual:
O barulho do brega by bregaforall
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